O arquiteto e escritor paulistano Toni Grado escreve desde os 15 anos, mas foi apenas aos 30, impulsionado pela morte precoce da irmã — morta por suicídio aos 34 — e por um mergulho profundo em seu abismo interior, que descobriu na escrita um caminho de elaboração e sentido. Nesse período, escreveu a peça A Saga de Félix Fars (1994), que conquistou o 3º lugar em um concurso estadual de dramaturgia do Sesi. Em 1997 passou a produzir textos filosóficos inspirados na esquizoanálise de Gilles Deleuze, um vasto material que abordava o recorte produtor do novo, do desejo revolucionário. Anos depois, essas reflexões deram origem ao seu ambicioso projeto literário.
“Na época em que escrevia o livro de filosofia, uma amiga me levou para um ciclo de palestras sobre Deleuze”, explica Toni Grado. “Senti uma identidade imediata com a visão inovadora do funcionamento do desejo e da produção do novo fora do espaço tempo linear e cronológico. Uma mistura de loucura e potencia criadora. Me incomodou um pouco o triunfalismo, a celebração eufórica dessa loucura esquizóide como solução para tudo. Só os não loucos querem ficar loucos, os loucos de verdade querem fugir desse desespero”.
Entre estudos de mitologia, psicanálise e filosofia, Grado mergulhou por mais de uma década em uma investigação sobre o desejo e a criação. Dessa imersão nasceu, em 2009, a série Não Branco Não Homem, que traduz em literatura os conceitos filosóficos explorados por ele. O primeiro volume foi lançado em 2021, e o último está previsto para 2026.
A série é uma obra de ficção, com elementos de romance de aventura. A narrativa apresenta múltiplos enredos interligados e inicia com a Algarismo, um bancário solitário de meia-idade, que vive assombrado pela culpa pela morte da mãe, que faleceu sufocada enquanto ele dormia. Apaixonado por filosofia, ele adota as ideias do filósofo grego Parmênides e passa a ver o movimento e o vazio como ilusões. Movido pelo desejo de escapar da rotina e dedicar-se ao estudo, planeja desviar dinheiro de um fundo para órfãos africanos, mas é surpreendido por Número 17 — uma entidade misteriosa entre anjo e demônio. Condenado a ouvir eternamente os lamentos da mãe, Algarismo recebe uma chance de escapar da punição: deve surpreender Número 17. Após várias tentativas frustradas, ele propõe contar uma história que provaria que o egoísmo humano é uma farsa.
A narrativa começa com Antor, um menino envolvido em uma guerra civil africana, e a origem do temido traficante Não Branco. O foco se desloca para a política e a especulação imobiliária na ficticia cidade de Cravos, centrando-se na morte brutal do engenheiro Ramirez e nas maquinações eleitorais entre os partidos PUP (esquerda) e PON (Direita), liderados indiretamente pelo banqueiro Robert Kotac e pelo estrategista Alexandre Dragun. A trama também acompanha a jornada da acadêmica Chris (Não Homem), uma figura andrógina que sofre violência e pressão para se conformar a uma identidade, e a luta de Michel Haddad, um jornalista experiente.
Não Branco Não Homem mergulha o leitor na complexidade psicológica de seus personagens. A forma visceral e filosófica de criar de Toni Grado, une observação da realidade, intensidade emocional e reflexão moral por todo o percuso dos três livros. Cada história revela tensões com diálogos afiados e uma mistura inusitada de humor e brutalidade.
“Os personagens Não Homem e Não Branco, muito mais do que a questão de gênero ou racial que parecem ensejar, empreendem as viagens heroicas de suas não-vidas não sendo e não aceitando para si mesmos nenhuma espécie de coerção identitária. Claro que infelizmente somos todos seres frágeis com muitas limitações, e eles vão descobrir as deles”, reflete o autor.
A série também inclui uma dedicatória comovente do autor à sua irmã falecida e um prefácio que discute os temas de diversidade, violência urbana e a complexidade da vida contemporânea. O prefácio enfatiza que no enredo “não cabem heróis mas podem haver ações de bravura e compaixão, também não existem vilões absolutos, mas haverá atos de crueldade, ambição e pura maldade”.
Sobre o quarto e último volume da série o autor afirma: “Todo mundo perdoa um mau começo em uma história, mas um mau final é inaceitável. O leitor pode esperar o inesperado. Muitas reviravoltas e, se tudo funcionar como eu planejei, uma mudança de plano que o obrigue a rever seus conceitos. Na verdade, escrevi o final primeiro e a última coisa que escrevi foi o primeiro capítulo. Não inventei nada, no caso, porque os manuais de dramaturgia já ensinam isso faz tempo: se você conhece o desenlace, todo o resto é preparação”, finaliza Toni Grado.
Sobre o autor:
Paulistano, Toni Grado, 64 anos, é arquiteto, escritor e músico. Formado em Arquitetura, construiu também uma trajetória no ramo da decoração, onde atua como pequeno empresário — atividade que lhe permitiu, ao longo dos anos, dedicar-se em meio período à sua grande paixão: a escrita.
Autor do romance em quatro volumes Não Branco Não Homem (volume 1, 2021; volume 2, 2022; volume 3, 2025), Toni também se destacou na dramaturgia. Escreveu as peças Saga de Félix Farsa, que conquistou o terceiro lugar no Concurso de Dramaturgia do SESI em 1995 — publicada em pequena tiragem pela instituição —, e Vida Besta, encenada em 1997 no Teatro Alfredo Mesquita, em São Paulo.
Paralelamente à literatura, Toni Grado desenvolve uma sólida produção musical. Lançou dois álbuns instrumentais autorais disponíveis no Spotify: Desoriente (2017), em parceria com o maestro e compositor Alexandre Guerra, e Trilhas para lugar nenhum (2021), trabalho solo que explora atmosferas sonoras de caráter introspectivo.
Atualmente, o autor se dedica à elaboração de um ensaio filosófico fruto de mais de três décadas de reflexões, provisoriamente intitulado Ontologia do Desejo e Metafísica do Poder.
Não Branco Não Homem
Autor: Toni Grado – instagram @tonigrado
Editora: Nine Editorial
Projeto gráfico: Francisco Martins
Ilustrações: Jack Azulota
Preços:
Volume 1: R$ 66,90
Volume 2: R$ 84,90
Volume 3: R$ 78,00






